Sinopse
“A Colecção Reler África (…) trata-se de uma colecção especializada em temáticas africanas no domínio das Ciências Sociais e Humanas. Ao inaugurar esta colecção, as Edições Mulemba da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto (Luanda – Angola) e as Edições Pedago (Mangualde – Portugal) pretendem criar um espaço de debate, alteridade e reflexão crítica sobre o continente africano.
A colecção publicará obras, textos e artigos compilados de reconhecidos autores africanos e africanistas, que contribuam para a compreensão e a reinterpretação do continente africano.
Além de apresentar uma visão endógena (de dentro) do continente, a colecção está aberta à comunidade científica internacional que tem o continente africano como objecto da sua pesquisa.” in Nota de Apresentação por Víctor Kajibanga
Investigação Científica e Crise da Racionalidade – Livro I
Face aos problemas de fundo formulados pela produção de conhecimentos no contexto africano, o investigador nativo não pode descartar a história e as teorias, os modelos e os métodos da ciência com os quais é confrontado desde a sua formação. Deve adoptar uma posição relativamente à herança recebida mesmo nos momentos em que deve avançar cuidadosamente, sem saber para onde se dirige, tentando penetrar cada vez mais num domínio complexo e difícil no qual, não obstante o discurso pedagógico, não existem regras a priori nem códigos estabelecidos. Todos devem fazer uso da sua imaginação para inventar o seu próprio caminho. Essa exigência implica o incumprimento de uma determinada ordem das coisas nas formas de pensar e de fazer com vista à integração num campo de iniciativas que ostentam a marca da sua aventura científica. Para entender melhor os desafios da inteligência que se impõem a África na actual dinâmica dos saberes, é necessário estudar as crises da racionalidade à luz da evolução histórica. Para o efeito, o autor frisa as atitudes e os comportamentos, os mitos e as crenças com os quais a sociedade circunscreve a ciência, sendo que os mesmos são incompatíveis com as exigências e as restrições da actividade científica.
As Culturas Africanas no âmbito da Racionalidade Científica – Livro II
Na medida em que a humanidade está em busca dos conhecimentos de todas as culturas, torna-se necessário questionar o modelo de mundialização dos conhecimentos, dando lugar aos actores da ciência situados em diferentes contextos culturais. Em simultâneo, torna-se conveniente dar a conhecer os riscos aos quais a humanidade se expõe quando a ciência que tende a globalizar-se é, na verdade, uma ciência em crise e quando, afinal, alguns paradigmas são colocados em causa no espaço da sua emergência. Os sábios e os filósofos que hoje se interrogam acerca da ciência no Ocidente mostram, de facto, que o modo como a ciência se desenvolve não responde às expectativas do próprio Ocidente. A procura de uma “ciência aberta”, de uma “razão mais total” ou de uma “complementaridade dos conhecimentos” põe em causa a prática de uma racionalidade particular, dominante e truncada. Nada justifica a pretensão absurda desta ciência de se identificar com “a razão universal”. No momento em que o Ocidente é assombrado pelas exigências de uma racionalidade que assumiu o dever de esquecer desde a separação da ciência e dos grandes sistemas filosóficos, uma espécie de vigilância epistemológica impõe-se à África. Deste modo, o cientista africano deve procurar construir uma nova coerência.
Neste sentido, impõem-se escolhas fundamentais a respeito da natureza da própria ciência. Estas escolhas obrigam a estabelecer novas relações entre a ciência e o resto da cultura, em particular a filosofia, a ética e a arte. Estas impõem uma orientação diferente ao pensamento.
A Investigação Africana Face ao Desafio da Excelência Científica – Livro III
Ao procurar recentrar a atenção nas problemáticas da África na era do conhecimento, insisto nas condições específicas que permitem reconstruir a ciência tendo em conta a crise do conhecimento colonial, a violência ou as artimanhas da racionalidade dominante e fechada. Esta iniciativa levou-me a interrogar a perspectiva que se tem da África e dos Africanos. Neste sentido, é necessário rever os conceitos e as grelhas de análise utilizadas, tendo em conta que estas são marcadas pelo etnocentrismo ocidental e pelo culturalismo que encerram a África no gueto do tropical e das espécies exóticas. É necessário aprender a pensar a África independentemente da perspectiva ocidental. É com esta abordagem que os investigadores africanos serão aceites no universo do conhecimento. A emergência desta nova racionalidade representa um desafio para os Africanos marcados pela Europa e pela América do Norte. Ao situar-nos no horizonte da invenção da nova ciência, trata-se de negociar com a herança recebida, e que faz parte da identidade do investigador africano. Nesta perspectiva, face à tentação do fechamento sobre si inerente aos delírios do afrocentrismo, a questão consiste em saber como sair dos guetos sem abafar este desejo de emancipação que obriga a dar provas de liberdade e a aceitar ter uma outra opinião científica diferente daquela que foi aceite no Ocidente.